Cores

Ela me enfeitiçou os dedos, me teceu os cabelos como corda e me puxou como se fosse sua para brincar. Ela me fez mulher novamente e de novo e de novo e de novo. Nós nos fizemos mulheres.

Casal formado por duas energias distintas que, juntas, conseguem ter mais poder que o próprio zodíaco. Encontro, conjunto, esferas ligadas por um fio, ela me deu um nó na garganta formado pelos panos da saudade.

Em uma dança sorrateira e fugaz, ela me hipnotiza os olhos, pernas, braços, bacia e cóccix. Me faço parte de sua coreografia nunca ensaiada antes por estes corpos nus de espírito, pois as vestes continuam a nos enfeitar à meia luz num quarto devidamente bagunçado pela casualidade dos dias.

Casualidade esta que me aproximou dela num piscar daqueles olhos castanhos claros que mais lembram a cor das pedras vivas de uma cachoeira que banha com água límpida toda a impureza que se pode habitar em um corpo. Esta é a potência do olhar dela.

Num movimento frágil, ela me pede para ser abraçada e eu a seguro como se fosse um maço de algodão. Leve, doce, macio e precioso. Formado por fibras minúsculas que representam cada singularidade dela, todos os traços os quais eu venho estudando nessas últimas semanas.

Ela faz com que eu me sinta como uma espécie de protetora de seu universo tão precioso nos momentos em que ela se entrega crua. E eu, com a minha altura de numeração duvidosa, nunca me senti tão grande.

Eu a cuido e ela cuida de mim, e é nessa balada de ombros e quadris encaixados que nós vamos nos protegendo desse mundo amargurado pela dúvida e insegurança que algumas pessoas têm a respeito do amor.

Eu derramo o verde enquanto ela derrama o azul, eu a cubro com o roxo e ela me borra os lábios de vermelho, nós fazemos o laranja ao tecer palavras para ela em amarelo e, nós, do nosso jeito, pingo a pingo com a nossa tinta, salvamos do nosso jeito esse mundo do desamor.